Cairo Mariano e Jeon Jungkook compartilham uma história que precede o tempo.
Nascidos no mesmo dia, cresceram juntos na pacata S?o Dimas, sob o abandono precoce da inf?ncia e o caos da puberdade. Agora, às vésperas dos trinta anos, é S?o Paulo que...
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INTRODUÇÃO
A sexualidade feminina tem sido historicamente moldada sob a perspectiva da vontade masculina, de modo que nem todas as mulheres tiveram acesso pleno e satisfatório à própria experiência sexual. Essa limitação compromete o potencial da sexualidade como instrumento de autoconhecimento e emancipação, da mente, da alma e da criatividade feminina, relegando-a ao limbo do desconhecimento do prazer. No contexto literário, essas restrições se refletem em representações que frequentemente instrumentalizam a sexualidade da mulher, subordinando-a aos desejos e narrativas masculinas. É fundamental destacar que a experiência sexual feminina não se restringe à interação com outra pessoa, mas envolve, de maneira central, a relação da mulher consigo mesma, que se configura como o espaço mais potente para a subversão da pena fálica e da influência patriarcal sobre suas vontades. Esta dissertação propõe analisar como a literatura tem representado e, por vezes, limitado ou libertado a sexualidade feminina, explorando as tensões entre desejo, poder e autonomia.
🕷️
Acho que foi naquele domingo que percebi que algo havia mudado de forma irreversível.
Como as transformações físicas que nos atingem em certas idades e alteram para sempre nossa percepção do mundo: o primeiro osso quebrado, a primeira menarca, um coração partido, um diagnóstico cruel e precoce que condena uma menina a nunca gerar filhos, as transições sutis que marcam o abandono da infância. E, de algum modo, um fragmento da minha também havia sido corroído por uma ideia igualmente nefasta.
Sentada à mesa da cozinha, digitava as páginas da dissertação com uma força incomum, tomada por uma criatividade súbita, quase violenta, o bastante para obrigar Jungkook a desviar os olhos da televisão e me encarar. ㅡ Tá hackeando o sistema de um banco, mano? ㅡ perguntou, com a boca cheia de pedaços de banana.
O reflexo da claridade da janela brilhava na superfície vítrea de seus óculos de grau quando olhei para ele, esboçando um sorriso desconfortável. Meus olhos fugiram rapidamente da tela do notebook, onde as quatro laudas e meia da dissertação se metamorfoseavam em pensamento e depois se projetavam, frias, no arquivo pálido que me encarava. Eu tentava encaixar as palavras, resgatar o efeito mágico da sua presença na minha cama pela manhã, uma entidade vestida de branco, saída do meu sonho, ou melhor, da minha fantasia, tomando forma mística em meu quarto.
Durante as primeiras horas do dia, me perguntei se deveria contar a verdade sobre a noite passada, sobre o gatilho estranho que senti na aproximação daquele homem mais velho. Mas quando ele entrou no quarto para me acordar, trazendo um café da manhã cuidadosamente preparado, só consegui me sentir culpada.
ㅡ Te acordei? ㅡ Ele perguntou, empurrando a porta com cuidado.
ㅡ Não, já ia levantar.
Ele tinha feito tudo do jeito que eu amava, até mesmo os cream crackers assados na manteiga, como mainha costumava preparar, cuscuz e café com leite.