Invicto

🚨Filipe🚨

Eu sempre tive problemas em pensar no pós morte.

É difícil pensar que tudo simplesmente vai acabar, e é mais estranho ainda pensar que a porcaria da sua alma pode parar no céu, inferno ou purgatório.

Não tenho medo de morrer, só não gosto das incertezas que a morte traz.

Quando desceram o caixão do Mathias o choro da esposa dele se intensificou. Aquele choro tão desesperado que mal sai som.

O cara já estava na polícia a anos, mas três meses no meu batalhão foi o suficiente pra ele morrer.

Anos de experiencia não foi o suficiente e uma bala na cabeça foi bem mais do que o suficiente. Morreu na hora, não tinha nada que pudéssemos fazer por ele.

A coisa foi tão feia que o caixão nem ficou aberto no velório.

Filipe: Falei que era uma decisão de merda.- Na verdade cansei de falar isso.

Oliveira: Acontece cara, não tem como evitar.

Filipe: Tem sim, falei diversas vezes que isso não ia dar certo. Pegaram um policial de escritório que nunca tinha dado cabo de alguém e colocou logo na minha operação. A pressa de preencher a vaga causou isso. O sangue desse cara tá nas mãos do Mourão. Aquilo ali-aponto pra esposa grávida do Mathias chorando- poderia ter sido evitado.

Oliveira: Ele vai querer fazer essa merda de novo, colocar alguém pra não deixar buraco no batalhão.

Filipe: Acho bom ele não bancar o maluco. Não vou ter mais ninguém sem o treinamento adequado no batalhão. Ou ele começa a me escutar ou arruma outro capitão.

Quero ver qual vai ser o maluco que ele vai por no meu lugar.

...

Mourão: Temos uma lacuna na equipe, não dá para ir pro campo com pouco pessoal.

Respiro fundo, afinal não posso xingar esse homem. Mas cara, o que não me falta é vontade. E pela cara que ele faz sabe qual a minha vontade.

Filipe: O que eu não posso fazer é ir pro campo com gente despreparada. Não dá pra subir o morro para tentar prender aquele cara e ser babá ao mesmo tempo.

Ferreira: O capitão tem razão,senhor. Mathias era despreparado e olha só no que deu. O cara nem vai ver o filho crescer. Porra, isso é muito foda.

Mourão: Vou ver sobre isso. Quero aquele  desgraçado preso, foquem nisso- o olhar se direciona para mim- Preso Alencar.- ele sai batendo à porta.

Ferreira: Ele sabe que a gente é só a equipe tática, né? Não dá pra prender alguém que a gente nem sabe quem é.

Filipe: Ele não se importa com isso.

Oliveira: A gente vai prender o traficante?- ele pergunta me encarando.

Filipe: Se tiver na mira é pra sentar o dedo sem piedade.

Ferreira: Vocês são macabros - ele aponta pro Oliveira - Olha o sorriso desse merda. Um psicologo vez ou outra faz bem.

Oliveira: Vez ou outra a gente tem que extravasar.

Ferreira: Vai no putero, porra.

Filipe: Tem alguma coisa errada com ele.

Oliveira: Agora que tu tá percebendo? Ferreira é idiota pra caralho. Te falo isso desde que ele entrou na equipe- bufo com a resposta.

Esses dois passam o tempo todo se provocando, um verdadeiro teste de paciência.

Filipe: Tô falando do Mourão. Não faz sentido toda essa pressa dele.

Oliveira: Nada que ele faz tem sentido. Ele só tá desesperado, precisa mostrar resultado pra não perder o conforto que tem.

Filipe: Mas cara, essa morte vai respingar nele. E se ele colocar outro despreparado vai ficar feio pra ele.

Oliveira: A não ser que ele possa por a culpa em outra pessoa.

Ele não vai botar essa merda em cima de mim, não mesmo.

...

Saio do banho e vou direto para a cozinha preparar algo pra comer.

Não tem como não ver as notificações no meu celular, grande parte da Gabriele, outras do Gilmar e do Leonardo.

Escolho ignorar todas, não tô no clima de ficar dando satisfação por mensagem.

Gabriele tem a língua maior que o corpo, não posso dar corda ou me faz mil e uma perguntas. Ou seja se eu responder uma mensagem é capaz dela me ligar.

Leonardo só me manda mensagem quando tem algum problema e precisa da minha ajuda pra resolver.

O Gilmar é um caso a parte, ele é controlado com as mensagens, sabe que eu não gosto.

Então tento responder ao menos as dele.

Gilmar é a única pessoa do mundo que faz com que eu me sinta um babaca ingrato.

Abro as mensagens e é basicamente o mesmo de sempre, quer sabe como estou.

Para não ter que dar maiores explicações respondo com um 'Estou Bem'.

Nossas conversas por mensagens não passam disso, a não ser quando ele aparece na minha casa em busca de mais informações.

Não gosto quando ele vem, aliás não gosto quando ninguém vem.

Mas ao menos ele não que nem a Gabriele que surge do nada na minha porta e toca a porcaria da campainha até eu abrir.

                                          ...

Oliveira: Então a gente vai subir de novo? Até onde eu sei não temos nenhuma informação nova.

Filipe: O cara que foi preso na última invasão me passou um endereço, segundo ele é a casa do Perigo. E nos informaram sobre um ponto de venda forte.

Ferreira: Bom, já é alguma coisa. Se a gente subir de madruga tem chance de dar certo. Não aguento mais esse cara.

Eu também não.

Te todas as pessoa que me mandaram prender esse é o que eu mais eu odeio. Não é fato de traficar e matar, é ele ser bom o suficiente para se manter escondido.

Filipe: Mourão tá no pé, quer que a gente faça isso rápido e que a operação seja um sucesso.

Oliveira: Bom, a gente vai subir com mais informações do que dá última vez, já é alguma coisa. Mas me irrita cobrarem resultados imediatos em situações como essa.

Ferreira: Alguém tem que aposentar aquele velho.

Concordo, mas ele sai outro filho da puta entra. É assim que o sistema funciona.

Oliveira: Beleza, lá vamos nós mais uma vez. Que pelo menos dessa vez dê certo. Esse filho da puta já esgotou a minha paciência.

Também quero que acabe, mas alguma coisa me diz que essa invasão não vai ser o fim dessa história.

Isso é porra de um problema que a cada dia que passa fica maior.