Quando voltei à Bangkok era vinte de dezembro.
Os copos que acreditava ter deixado sobre a pia estavam lavados e guardados. O lençol era limpo e a cama arrumada. As flores, apesar de mortas, agora estavam em um vaso sobre a mesa. Mesmo não estando ali, ele estava em todo lugar. Com certa dificuldade, arrastei a mala para o interior da casa e me sentei no chão ao lado dela, tirando algumas roupas para fora na intenção de encontrar o telefone que havia desligado a seis meses atrás. Eu sabia exatamente o que estava fazendo e meus motivos, mas ainda hesitava. E se não tivesse nada? E se ele sequer se lembrasse?
Era de Ohm Pawat que estávamos falando.
Me lembro bem da exata quantidade de ligações: mil novecentos e quarenta e duas. Durante seis meses, ele me ligou quatro vezes por dia. As mensagens na caixa postal variavam de dez segundos preenchidos com um simples vazio e iam até monólogos de vinte minutos que eu nunca tive a coragem de ouvir, exceto por um. Gravado em dezoito de dezembro, era sua última tentativa de conexão.
"Oi, pirralho... você tinha razão, sabia? Nunca choveu tanto em Bangkok como hoje. Espero que tenha chovido aí também. Ou não... não sei se você encontrou alguém pra te proteger dela. Seria muita burrice acreditar que não, né?... eu achei que você voltaria. Eu estou na sua casa. Deitado na sua cama. Ela ainda tem seu cheiro e isso me irrita tanto... perguntei de você pro Dunk. Eu não sei se ele mente quando diz que não sabe de você... sabe... as vezes eu fico pensando se a culpa foi minha. Se eu não fui bom o suficiente para você pensar duas vezes antes de ir. Mas sabe no que eu gosto de acreditar? Que você se apaixonou por mim de verdade, Non, e por isso você fugiu. Não vem me dizer que foi por causa da empresa porque eu sei que não foi... ninguém nem lembra que aquilo aconteceu. Aliás... eles lembram quando me vêem ligando para você nesse estado. A gente sente sua falta, Nanon... eu sinto sua falta... pra caralho... porra, essa cidade é horrível, é vazia sem você... eu preciso que você volte... ou então me deixa ir até você... por favor... já era pra eu ter te esquecido. Eu nem devia lembrar que dia é hoje, mas você... como eu vou esquecer você?... eu queria tanto que você soubesse- você sabe como é perder alguém que ainda tá vivo? Eu duvido... se você soubesse não faria isso com ninguém. Eu espero que seu aniversário esteja sendo ótimo. Que seus dias em Nova Iorque, ou em Paris, ou seja lá onde você esteja, sejam os melhores da sua vida. Meu desejo para o seu aniversário é nunca mais te ver na vida. Te esquecer pra sempre. Não quero mais saber de você. Não quero... não quero mais te ver, não quero amar você, nem escrever sobre você, nem ligar mais pra você. E eu espero que você lembre de mim pelo resto da vida. Lembre do que você tá fazendo comigo porque isso é muito mau. Eu nunca faria isso com você. Eu te amo... volta logo, Non... eu não aguento mai-"
Me recusei a ouvir os cinco minutos restantes e desliguei o aparelho outra vez, o jogando no fundo da última gaveta da cabeceira ao lado da cama esperando nunca mais vê-lo. Eu e você sabemos que, se isso fosse verdade, eu teria simplesmente o jogado fora. Me deitei na cama, arrumada pelo último homem que ali esteve e mantive meus olhos sobre o teto que costumávamos olhar juntos. Eu ainda via seus olhos fixos sobre mim. Ainda sentia seu cheiro no meu travesseiro, seu copo favorito ainda estava no armário ao lado do pó do café que ele tomava todos os dias, sem exceção. Sua escova de dentes estava no banheiro, seu shampoo, sua toalha, suas roupas no meu guarda-roupa e tudo aquilo me atormentava. Pawat estava em todo lugar e em lugar nenhum. Não consegui dormir na primeira noite. O barulho do mar me incomodava.
Desde junho, eu não falava com meus amigos, nem Aof, muito menos com meus pais e essa era um dos motivos para temer que me vissem. Tinha medo que todos se lembrassem do ocorrido e eu nunca mais fosse capaz de ser algo ou alguém além dele, mas mais do que isso, eu tinha medo que me rejeitassem então por dois dias, escondi meu rosto e mantive meu corpo longe dos lugares que costumava frequentar, mas foi em vão. "Nanon Korapat está de volta em terras tailandesas. O que se pode esperar depois do hiatos do ator?"

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June Gloom
RomancePara Ohm Pawat, que me ensinou a n?o ter medo de amar embora eu soubesse que essa seria a raz?o do meu fim.