O mundo ao meu redor encolheu em um instante. O calor suave do pôr do sol na varanda já não fazia sentido. O som distante da cidade, os carros, o vento... tudo se tornou um zunido abafado, irrelevante, como se eu estivesse sendo puxada para dentro de um vácuo.
Minha garganta se fechou.
— O quê? — minha voz saiu fina, quase inexistente, mas a pessoa do outro lado da linha continuou a falar, como se não tivesse ouvido o desespero engasgado na minha respiração.
Acidente.
A palavra reverberou dentro da minha cabeça, sacudindo tudo ao redor.
Marlina me olhava fixamente, sem piscar, esperando que eu dissesse algo. Mas eu não conseguia. Minhas mãos estavam tão frias que mal conseguiam segurar o celular.
— Senhora? — a voz do outro lado da linha insistiu.
Meu estômago revirou. O peito ficou pesado, como se algo estivesse esmagando meus pulmões.
— Eles estão bem? — forcei as palavras, mas elas saíram quebradas.
Silêncio.
O silêncio durou tempo demais. Tempo suficiente para que o frio percorresse minha espinha, tempo suficiente para que Marlina arrancasse o celular da minha mão, percebendo que eu já não conseguia mais respirar.
— Alô?! – a minha irmã atendeu e conseguiu falar um pouco mais alto. — Sim, nós somos filhas dele. O que aconteceu?
Eu não consegui ouvir absolutamente nada do outro lado da linha.
— Como...?
Os olhos de Marlina se encheram de lágrimas e suas mãos começaram a tremer. Seu rosto, que já estava vermelho por causa do sol, foi tomando proporções cada vez mais rubras.
— Mas, por quê? Onde?
Mais silêncio. Era um vazio cruel, um espaço de tempo que esticava a angústia, como se cada segundo fosse um fio invisível me cortando por dentro.
Marlina apertou o celular contra a orelha, as sobrancelhas franzidas, a respiração falhando entre uma pergunta e outra.
— Não... não, isso não faz sentido — ela balbuciou, engolindo seco, sua voz embargando de um jeito que eu nunca tinha ouvido antes.
Eu queria perguntar. Queria saber. Mas minha boca parecia costurada, meus pulmões não conseguiam puxar ar suficiente para formar qualquer palavra. Meus olhos ardiam, e o medo tomava conta de cada parte do meu corpo.
— Papai... — um sussurro escapou de seus lábios, mas foi como um grito estrangulado. Ela cobriu a boca com a mão livre, os olhos arregalados, e olhou para mim como se o chão tivesse sumido sob seus pés.
Meu estômago embrulhou.
— Tudo bem, obrigada – Mar concluiu, desligou o telefone e afundou sua cabeça entre suas mãos.
Toquei em minha irmã sem saber como questionar sobre a real situação. O que tinha acontecido, afinal?
Onde eles estavam? Foram para um hospital?
— Mar... o que... — precisei puxar fôlego do fundo da minha alma para questioná-la. — O que devemos fazer? O que aconteceu, exatamente?
Minha irmã suspirou e gemeu antes de responder:
— Eles sofreram um acidente... papai não resistiu.
Senti um peso enorme cair em meus ombros. Todo o sangue do meu corpo parecia estar congelado.
— Como? O que houve? Onde eles estão agora? E a mamãe e a Jaqueline?
Ela engoliu em seco.
— Estão em São Félix, na cidade vizinha, no hospital municipal – ela disse com a voz trêmula. — Nossa mãe e a Jaque estão lá, ainda vivas. Papai... se foi. Ele morreu na hora da batida.
Os dois dias que se seguiram foram como um lapso, um borrão entre o choque e a realidade cruel que se recusava a fazer sentido. O tempo perdeu a lógica. Minutos se arrastavam como horas, e, ao mesmo tempo, tudo acontecia rápido demais para que eu pudesse processar.
Marlina e eu fomos levadas até São Félix pela tia Paty, que chegou na cidade naquela madrugada, porque nenhuma de nós tinha idade o suficiente para dirigir e sequer tínhamos condições de irmos para lá sozinhas, de ônibus ou Táxi, e fomos instruídas por ela, que nos ligou cerca de dez minutos mais tarde naquele dia. O trajeto foi feito em silêncio absoluto, apenas o som dos pneus contra o asfalto preenchia o carro, e a cada quilômetro, a sensação de sufocamento aumentava.
Soubemos que Jaqueline e mamãe estavam na UTI, e nossa irmã perdeu o bebê.
Ambas permaneciam inconscientes. Mamãe estava em coma, e Jaqueline também – mas o dela era induzido, e a sua situação um pouco menos delicada.
Nesses dois dias, eu não falei absolutamente nada. Nenhum som a mais saiu da minha boca.
Eu não conseguia.
Não conseguia porquê achava que tudo aquilo poderia ter sido evitado... se eu tivesse dito a verdade.
Quando Luke apareceu, foi no dia do velório do meu pai. Ele e seus irmãos se aproximaram com cautela, sem muito escândalo, o que me fez entender de que não Luke não estava bravo por causa das condições em que ele estava metido.
Nós passamos o tempo todo em silêncio, foram apenas seis horas de vigilância por causa das condições em que o corpo estava.
Pelo que entendi, meu pai estava na frente, sozinho, dirigindo, e mamãe atrás com a Jaqueline. Todos estavam de cinto, mas o carro bateu em alta velocidade de frete a um caminhão.
Não consigo parar de pensar nesses detalhes. Todos os problemas que envolviam a viagem deles de última hora. O estresse, a raiva fluindo nas veias, que fez meu pai correr mais, cego mediante as circunstâncias em que se encontravam naquele instante, acreditando que estava indo reestabelecer a honra da minha irmã.
Indo brigar com Luke por uma coisa que, talvez, nem seja real.
Por que Jaqueline diria aquilo se fosse mentira? O que ela ganharia com isso? Eu não consigo achar uma boa desculpa para isso acontecer. Talvez ela estivesse com medo, confusa e achou que mentir seria uma boa solução. Talvez Luke fosse mesmo o pai, e ela se confundiu ao dizer que dormiu com ele.
Eu não sei, e nem consigo imaginar como irei explicar isso para o Luke quando for a hora. Por que, quando ele ouvir a versão da Jaqueline, ele vai se lembrar quem realmente estava ao seu lado naquela noite.
— Você não quer comer alguma coisa? – Luke me questionou quando me viu sentada, sozinha, perto do canto de flores do cemitério. O corpo já havia sido enterrado a pelo menos vinte minutos, mas eu não conseguia sair dali.
Apenas neguei, em silêncio.
Ele suspirou tão longamente que me fez encará-lo. Eu queria sair correndo e, de preferência, nunca mais falar com ninguém.
— Você precisa comer, Sam. A sua tia disse que não coloca nada na boca a dois dias.
Encarei o chão. Meu rosto estava inchado de tanto chorar, meus olhos ardiam.
A culpa era minha, não era? Como eu iria explicar isso para ele?
Eu deixei meu pai morrer, minha irmã perder o bebê e ela e mamãe entrarem em coma. Tudo isso porque não contei para eles que eu dormi com o Luke.
Tudo porque não confrontei Jaqueline com mais afinco.
Se eu tivesse aberto a boca, ao menos teria dado mais tempo para eles conversarem. Talvez Jaqueline dissesse que era mentira. Talvez ela continuasse com a sua versão, mas eles sairiam mais tarde e não encontrariam o caminhão que os acertou naquela curva na estrada.
— Vamos sair daqui. Tem uma lanchonete perto da avenida.
Eu neguei novamente.
Luke passou seus dedos nos meus cabelos e afagou a minha bochecha.
— Não gosto de te ver assim – ele sussurrou. — Eu sinto muito por tudo isso.
Ele engoliu em seco antes de continuar:
— Amo você, e sabe disso, não é? Não quero, de maneira nenhuma, que se sinta mal a ponto de desmaiar. Então, Samantha, colabore. Sua mãe e sua irmã ainda estão aqui e eu sei que você vai dar tudo de si quando elas precisarem.
Ele balançou a cabeça.
— Não, me desculpe. Essa foi a pior coisa que eu poderia ter dito agora. Por favor, não pense em como elas precisarão de você, eu sei que isso vai virar um fardo daqui a pouco. Você sempre foi assim. Abraça os problemas dos outros e se esquece de você. Pode chorar enquanto estiver doendo.
O fitei novamente.
— Mas eu... eu preciso confessar uma coisa a você. — Os olhos de Luke marejaram enquanto me encarava. Ele parecia um pouco sufocado, cauteloso, mas definitivamente não estava irritado. — Estou feliz que você não estava naquele carro. Droga, como eu remoí isso durante esses dois dias!
Levantei as sobrancelhas, confusa.
— Quando a sua tia contou para todos que seus pais tinham sofrido um acidente grave, foi a primeira coisa que me passou pela cabeça. Acho que nunca gritei tão alto o seu nome, nem mesmo quando você competiu. Pensei que você também estivesse lá. Naquela altura, nem consegui raciocinar o fato de que você havia me ligado naquela tarde. Quando ela me disse que era somente a Jaqueline, meu corpo inteiro apagou por um momento. De alívio. Foi como se eu mergulhasse numa banheira de água quente e minha pressão fosse parar no meu pé. Droga, eu mal me importei com a sua irmã, e isso foi a coisa mais egoísta que eu já senti em toda a minha vida.
— Você... ficou com medo? — foi a primeira coisa que eu disse em todo esse tempo.
— Acho que a palavra medo nunca fez tanto sentido na minha vida quanto a dois dias atrás. — Luke sorriu, sem jeito. — Eu me perdi de mim mesmo naqueles segundos, porque pensei que tivesse perdido você.
Senti que iria chorar novamente, agora por um motivo a mais. Luke me abraçou de lado, segurou forte as minhas mãos e me deixou fazer isso em seu ombro por pelo menos quinze minutos ininterruptos.
Quando levantei a cabeça, o vi chorar também. De tristeza e alívio, era fácil entender.
— Eu também amo você – finalmente o respondi, sentindo uma pontada no peito.
— Eu sei. — Luke disse, limpando os seus olhos com os dedos.
Me levantei e o puxei pela mão. De repente, percebi que estar ali nos torturava mais do que qualquer coisa, porque não adiantava o quanto eu arrastasse o momento da despedida, ela precisava acontecer.
Fui no túmulo do meu pai e deixei a única rosa que eu levava perto de sua lápide. Marlina e tia Paty ainda estavam por ali, mas não próximas o suficiente. Minha irmã tentava se manter firme mesmo com todos os seus problemas de saúde, e eu sabia que esse baque, em algum momento, iria ser cobrado pelo seu corpo.
Me lembrei da última coisa que ouvi meu pai dizer. Ele se dirigiu para Mar pela primeira vez em toda a minha vida e pediu que ela cuidasse de mim. Me lembrou, por um momento tão breve, que eu era a caçula daquela família, e eu me senti como se fosse a pessoa que tem menos responsabilidades uma única vez.
Mas esse tempo durou muito pouco, porque agora eu sabia que iria ser cobrada novamente.
Luke e eu saímos dali e ele se esforçou em me fazer comer, por vezes até abrindo a minha boca, colocando alguma coisa nela e mexendo no meu maxilar. Foi a primeira vez que esbocei um sorriso, mesmo que me doesse a alma deixa-lo sair.
E então, uma semana se passou até mamãe e Jaqueline serem transferidas de uma cidade para outra, e nossa irmã retirada do coma induzido. Ela estava com o pulso fraturado, muitos machucados pelo corpo, levou uma pancada na cabeça e estava e bem debilitada, mas acordou sem problemas.
Naquela altura, eu e Marlina estávamos sendo cuidadas pela tia Paty, em nossa casa, mas Armando e seus filhos também estavam na capital. O natal estava muito próximo, mas o clima ali ainda era pesado e denso como uma nuvem carregada prestes a desabar sobre nós. A árvore fora montada na sala da casa em que os Alexander estavam, mas suas luzes piscavam de forma melancólica, sem a alegria habitual. Nenhum de nós tinha ânimo para comemorações.
— Nós precisaremos cuidar da Jaqueline quando ela chegar – tia Paty disse quando nos reunimos para jantar. — Ela logo sairá da UTI e não deve demorar a receber alta, mas ainda inspira grandes cuidados.
Todos à mesa se entreolharam, cada um com inúmeros questionamentos na garganta.
Eu sabia sobre o quê estavam curiosos. Luke achava que eu tentei ligar para ele insistentemente naquela tarde por causa do acidente e tentou me fazer mais perguntas, mas não abri a boca para responder absolutamente nada.
Eu deveria tomar coragem e conversar com ele. Contar exatamente o que estava acontecendo àquela altura. Contudo, não tinha cabeça para isso, porque tudo o que se passava nela me trazia angústia.
Como minha mãe ainda estava em coma e não chegavam boas notícias sobre ela, Luke desistiu de tentar conversar comigo sobre qualquer coisa relacionada a esse assunto. Ele tentava, às vezes com êxito, às vezes em vão, me distrair. Confesso que só consegui me alimentar quando ele estava por perto, mas, quando não estava, era como se o tempo se arrastasse ou passasse por mim rápido demais, o que fez a tia Paty se apavorar e conseguir alguns ansiolíticos mais fracos para que eu e Marlina nos acalmássemos.
Porém, naquela noite, todos estavam ali para conversar sobre a situação em que nós nos encontrávamos agora. Principalmente eu e minhas irmãs, que não tínhamos nossos pais presentes.
— Agora que todos estão mais calmos, vamos nos planejar para este fim de ano, então — Armando disse, tentando amaciar a voz.
— Planejar o quê para este fim de ano? Não tem clima – foi Liam quem o respondeu.
E ele tinha razão.
— Você tem razão, não tem. Mas, como a Jaqueline voltará em breve, devemos recebê-la com cautela. Ela ainda não sabe da situação dos pais, apenas sobre a perda do bebê. Então, Liam, fique na sua e colabore, porque é preciso ter empatia na hora de contar e não acho que ela vá querer saber por causa dessa sua boca de sacola – Luke o repreendeu.
Seu irmão franziu a testa como se não compreendesse o que ele havia dito.
— Será que alguém pode dizer o que é que estava acontecendo naquele dia? – Liam questionou mesmo assim, olhando para mim e Marlina como se não aguentasse mais esperar por fofoca. — A Jaqueline estava grávida. Era óbvio que ela estava pelo jeito que ela ficou no parque. O que aconteceu? Os seus pais se estressaram por causa disso?
— Liam, não é o momento de falarmos sobre isso! A garota ainda está internada — Armando lembrou.
— Mas a mãe dela ligou insistentemente para a sua noiva antes de sofrer o acidente! Eles estavam indo para Santo Antônio, era óbvio!
De todos presentes à mesa, Liam era o único que deveria estar de fora dessa conversa, mas aparentemente não se importava em ser inoportuno.
— Quem era o pai? – ele perguntou, e eu senti meu estômago, que estava fazendo um esforço enorme para digerir o alimento que eu insistentemente colocava para dentro, embrulhar. — Era você, Luke?
Eu quis sumir dali e me esconder em uma caverna. Para sempre.
— Tá maluco? – Luke pareceu mais indignado do que imaginei. — De onde você tirou essa ideia?
— Eu me lembro muito bem da Jaqueline te mandando indiretas lá no parque.
— Indiretas? – Armando se atentou e encarou o filho. — Do que estão falando?
— A Jaqueline brigou com o Luke naquele dia. Ela estava com muita raiva dele e queria a sua atenção a qualquer custo, principalmente depois de passar mal em um dos brinquedos, mas ele correu dela e se fez de desentendido. Léo pode confirmar o que eu estou dizendo.
Luke revirou os olhos e Léo nada disse.
— Eu sabia que ela estava grávida, ela me contou da sua suspeita – ele confessou e eu me surpreendi. — A Jaqueline ainda acha que eu sou o melhor amigo dela e sai falando coisas de que, sinceramente, não me interessam.
— Você... sabia? – Marlina deixou sair o que estava na minha garganta.
Luke engoliu em seco.
— Ela me mandou mensagem – foi tudo o que ele disse.
Tia Paty franziu o cenho.
— E?
Ele deu de ombros.
—Ela estava desesperada e queria dinheiro para tirar, pelo que entendi, antes dos pais descobrirem. E foi só isso a nossa conversa.
— Por que não me disse nada? – perguntei para ele, quase num sussurro.
Luke me encarou um pouco amedrontado. Isso não me ajudou em nada.
Tia Paty se levantou da cadeira e fitou Luke com os braços cruzados, um pouco irritada agora.
— A minha irmã me ligou naquele dia e deixou um correio de voz pavoroso xingando você, Luke, porque tinha certeza de que era o pai.
Os olhos de Luke se arregalaram até ficarem gigantescos.
— Está maluca? Eu não era o pai dessa criança! Eu só soube que ela estava grávida, porque a Jaqueline queria dinheiro para tirar e pediu para mim!
— Mas, a Jaqueline disse para nossos pais que você era o pai dessa criança – Marlina lembrou, o encarando firme e dando os detalhes. — Ela jurou de pé junto, mesmo que eu e a Samantha questionássemos sem parar. Meu pai morreu acreditando nisso.
O semblante de Luke ficou completamente branco e ele olhou para mim. Não sabia o que queria com essa atitude, mas possivelmente achava que eu acreditava nisso.
— Eu não sou! – ele afirmou, quase que exclusivamente para mim. Depois, olhou a todos à mesa e falou de novo em voz alta: — Eu não sou! Não tem nem sentido! Eu nunca toquei na Jaqueline dessa forma, como posso ser pai de uma criança sendo que...
Luke suspirou, tentando se controlar do nervosismo que estava deixando seu corpo transparecer. Sua linguagem corporal não estava mesmo ajudando em nada.
— O que foi que a sua irmã disse? – ele perguntou para mim como se aquela conversa fosse só entre nós dois.
— Ela disse que dormiu com você naquela noite do aniversário da Alice, depois que a tia Paty a levou para a sua casa – Marlina respondeu quando notou que eu não o responderia.
— O quê!? — O rosto de Luke se contraiu e ele me encarou com mais firmeza ainda. Droga, eu não queria estar do lado dele naquele instante. — Jaqueline disse que ela dormiu comigo naquela noite? QUE ELA DORMIU COMIGO?
O som da sua voz saiu tão alto que meus ouvidos estremeceram. Fechei os olhos, engoli em seco e senti meu mundo inteiro rodar. Eu estava absolutamente ferrada.
— Luke, se isso for verdade... — Armando o ameaçou sem nem precisar terminar a sua frase.
— Mas é mentira! Como ela pode ter dito isso? Eu nunca toquei na Jaqueline dessa forma, nunca abri espaço para intimidade e eu não dormi com ela naquela noite! Eu posso jurar sob qualquer coisa!
— Mas ela estava mesmo lá naquele dia – Léo notou. — Vocês não se encontraram...?
— Por que é que a minha palavra é questionada? Passei a festa inteira às vistas com a Sam, fui para casa ao lado de vocês e não dormi com a Jaqueline, garanto isso!
— Mas ela queria muito te contar sobre a gravidez – Liam relembrou.
— Para pedir dinheiro! Eu era o único que podia ajudar ela a fazer isso, mas eu não dei!
— Tem como provar? Ou será a sua versão contra a dela? Principalmente agora que a Jaqueline perdeu o bebê e o material da curetagem foi descartado, não tem mais como fazer teste de DNA – seu pai argumentou.
Todos à mesa o encaravam com grandes julgamentos. Luke colocou suas duas mãos no rosto e esfregou os olhos em seguida. Depois, me olhou ali, ao seu lado, quase imóvel.
De repente, a respiração dele se tornou mais forte. Estava ficando irritado.
— A Jaqueline disse a vocês, antes de sair de casa com os seus pais, de que eu dormi com ela naquela noite? Especificamente naquela noite?
— Exato. E não mudou a sua versão mesmo quando nossos pais a empurraram para a viagem de última hora para confrontar você — Marlina esclareceu.
Ele me encarou de boca aberta.
— ME CONFRONTAR? – ele berrou novamente, inconformado com a minha paralisia. — E você não disse nada, Sam?
Luke se levantou da mesa abruptamente. Ele havia entendido o que eu estava evitando dizer.
— Samantha! Você não disse nada para seus pais? Você não me defendeu? – ele ignorou todos os outros.
Eu quis afundar no chão.
— O que a Samantha tem a ver com isso? – tia Paty interrogou.
Luke cerrou os punhos, respirando de forma pesada, e bateu a mão contra a mesa com tanta força que os copos tremeram. Seus olhos ardiam em um misto de fúria e incredulidade.
— Ela tem tudo a ver com isso! — Ele apontou para mim, sua voz saindo rouca de raiva. — Ela sabia que era mentira, sabia que eu nunca dormi com a Jaqueline! Mas ficou calada!
Eu abri a boca, porém nada saiu. Meu peito apertava, minha garganta parecia travada.
— Eu não acredito nisso... — Luke riu sem humor, passando as mãos pelo cabelo, os dedos puxando os fios de pura frustração. — Eles vieram atrás de mim, Samantha. O seu pai veio atrás de mim e morreu por causa disso!
— Eu... — minha voz mal saiu.
— Você percebeu o que aconteceu?! — Ele gritou. O rosto estava ficando cada vez mais vermelho, o peito subindo e descendo rápido.
— Eu não consegui dizer nada — soltei, sentindo as lágrimas queimarem meus olhos.
— NÃO CONSEGUIU DIZER?! — Luke bufou. Seu corpo inteiro tremia de raiva. — Você deixou que seus pais acreditassem nisso quando tinha a capacidade de questionar a sua irmã?!
— Eu tentei! — minha voz saiu embargada.
— Tentou? Quando? Quando foi que você tentou, Samantha?! Porque, pelo que eu vejo, você ficou calada o tempo todo! O que foi? Está com vergonha do que aconteceu? Ficou com vergonha de mim?
— Do que diabos esse garoto está falando? — Armando questionou, sem se direcionar a ele.
Luke olhou ao redor, notando os olhares de julgamento e as expressões tensas. Seu peito subia e descia em um ritmo caótico. Seus dedos tremiam ao lado do corpo.
— EU DORMI COM A SAMANTHA! – ele soltou sem medo, e o meu corpo pareceu entrar em combustão, queimando cada órgão interno com o fogo da culpa que carregava em minhas veias. — Foi ela quem dormiu comigo naquele dia! Ela! Ela estava comigo madrugada a dentro, mesmo antes de a Jaqueline chegar em casa! Ela estava comigo quando dormi, e estava quando acordei. Eu não dormi com a Jaqueline naquele dia!
Afundei meu rosto em minhas duas mãos.
— Diga a eles, Samantha! Você não teve a capacidade de falar com os seus pais antes deles saírem desesperados e virem atrás de mim, mas conte agora! É o mínimo que pode fazer!
Eu engoli em seco.
— Eu... — Soltei um soluço forte antes de conseguir continuar. — Eu fiquei em dúvida porque vi você e a Jaqueline naquela manhã...
— Então isso é verdade, Samantha? Você dormiu com o Luke? – tia Paty se impressionou.
— Não aconteceu nada do que estão pensando, eu juro! Nós dois só dormimos.
Luke cruzou os bravos.
— Mesmo que tivesse acontecido qualquer outra coisa, você deveria ter dito. Deveria ter confrontado a sua irmã e contado a verdade. Seus pais iriam saber que ela estava mentindo e não viriam atrás de mim! Eles não teriam passado por nada disso!
Comecei a chorar, minha respiração falhando enquanto as lágrimas quentes escorriam pelo meu rosto. Eu já tinha chegado a essa conclusão. A culpa era totalmente minha. Eu queria falar, queria me justificar, pedir desculpa e assumir todo o meu erro, mas tudo o que saía era um choro trêmulo e desordenado.
— Vocês entenderam agora? — Ele abriu os braços, olhando de um por um. — O pai dela morreu por causa de uma mentira. Uma mentira que poderia ter sido desfeita com uma única frase!
— Mas, naquela manhã, você e a Jaqueline...
— A Jaqueline tinha ido ao meu quarto me pedir dinheiro para comprar pílula do dia seguinte – ele informou antes que eu o acusasse de algo. — Ela transou sim com algum idiota por aí. Eu não sei quem é! Pedi para ela não me contar. Não me interessava naquele dia. Mas, agora, questionem a ela, porque eu faço questão de que limpem o meu nome!
Um silêncio espesso tomou a sala. Meu coração martelava descompassado.
— Samantha... — Marlina chamou baixinho, sua voz carregada de preocupação.
— Eu juro que não sabia que ia terminar assim — minha voz saiu fraca, quase inaudível. Meus dedos apertaram as laterais da cadeira com força. — Me desculpe, Luke.
Luke riu, de novo sem humor, e deu um passo para trás.
— Você não sabia? — sua voz saiu incrédula. — Como você não sabia? Seu pai estava fora de si, sua irmã estava descontrolada, e você simplesmente... não sabia?
Eu o encarei por entre as lágrimas.
— O que achou que fosse acontecer? Que eu magicamente me tornasse o pai dessa criança? Que eu pudesse mudar o passado e ter trocado o seu corpo com o dela na minha cama?
Minha cabeça mal consegue raciocinar desde aquele dia.
— Você poderia muito bem ter ficado com ela naquela manhã – eu o confrontei. — E não me contou absolutamente nada disso que está dizendo agora! Se tivesse me dito, talvez eu tivesse menos dúvidas.
— Você estava com dúvidas mesmo depois de tudo o que aconteceu entre nós dois? Depois de dormir comigo naquela noite? O que acha que eu sou? Um porco? Um idiota desprezível que fica brincando com o coração de vocês duas?!
— Você sempre foi o garoto mais... mulherengo que eu conheço! – soltei sem pensar duas vezes.
— Quer saber? Chega! — Luke exclamou e passou as mãos pelo rosto. — Eu odeio você, Samantha!
Notas Finais:
Hello darkness, my old friend... 🎶
O título do capítulo e o capítulo de matar. E voltamos a estaca zero (ou quase isso).
O que acham que vai acontecer agora?
Vocês estão do lado do Luke? Acham que ele tem razão?
Vai ter passagem do tempo meus amores e eles (ela, principalmente) vai chegar aos 18 anos. Sabem o que isso significa? 😏
Obrigada a todos que comentam e votam, adoro ler os surtos de vocês.
Beijos e até a próxima 💖