— Eu tenho que me livrar disso, eu tenho que jogar fora. — Clama a jovem Sara.
— Por que ? — Questiona a madrasta aflita.
— Porque é dela...é o sobrenome da minha mãe , Simone. — Os lábios de Sara e as mãos tremem quando ela pronuncia "mãe".
— Olha, é muito difícil mesmo, entendo sua dor, seu pai se foi... — Ela faz uma pausa longa. E agora sua mãe tenta falar com você depois de quase 18 anos, isso é demais, mas não,não jogue fora. — Simone se aproxima da enteada aos poucos.
— Não é da minha mãe, o nome dela era Catarina, e ela está morta. Morreu assim que chegou a Portugal, num acidente de carro saindo do aeroporto.
— Sara conclui com a voz embargada e dura. Simone fica em choque.
— Ele também nunca me contou. Afinal, é melhor uma mãe que te abandonou viva, do que morta, não é? — Completou a garota, minutos antes de desabar em um choro profundo e mergulhar no abraço da mulher à sua frente.
— Eu só descobri a poucos dias, tinha um recorte de algum jornal português, junto com nossos álbuns de fotos. Eu sou órfã Mone.
— Você nunca será órfã enquanto alguém te amar,e Sara, eu te amo como minha filha.
— Eu também te amo. — As duas se encaram com os olhos cheios de lágrimas, Sara levanta seu braço em direção a madrasta. — Agora, me ajuda a queimar este papel.
— Olha, eu não posso mesmo, não tenho direito de decidir por você, ou implicar e impor opinião alguma. Mas como alguém que te ama, e já viveu muito essa vida, por favor flor, leia, se não gostar queime depois, leia Sara.
— Simone se aproxima , com a voz embargada.
Ver Simone chorar, alguém tão alegre, era amargo demais, totalmente insuportável para Sara. A madrasta era a pessoa mais bem astral que já viu, e parecia que o mundo estava invertido quando chegava a este ponto, ela não podia aguentar ver mais uma vez essa cena, não como o dia em que seu pai se foi. A razão e a emoção, a pior batalha humana para Sara, decidir sempre foi a pior parte de estar vivendo junto com outras pessoas.
E o toque final para a decisão foi ouvir Simone dizer: Sara. Invés de um apelido carinhoso, ou mudança de entonação, sua madrasta não era assim.
— Eu vou ler então, por você, apenas por você Simone. Deve ser apenas uma carta de luto. — A face da jovem se esfria, ela pigarreia para espantar a vontade de chorar e melhorar sua voz trêmula.
22 de Abril de 2018 , Coimbra, Portugal .
A minha querida neta, Sara Costa Albuquerque. Acho que você já percebeu a semelhança de nossos sobrenomes, sou sua avó e venho por meio desta carta lhe desejar condolências pela perda de seu pai. Lamento não ter lhe enviado cartas quando você era pequena, mas minha vida agitada e poucos anos de boa saúde sanaram as oportunidades. Agora, embora você esteja prestes a completar a maioridade brasileira, sua guarda pertence a mim, seu responsável legal mais próximo. E como forma de compensar meu grande erro, querida menina, ofereço-lhe tudo o que negligenciei, minha casa e bons estudos, a universidade vai aceitá-la, espero por você, responda-me assim que ler, e eu vou te trazer para cá ,
Com esperança, sua avó,
Tereza Costa Albuquerque.
— Eu não acredito! — Sara joga o papel ao chão, e coloca as mãos sobre a cabeça. — Quase 18 anos , e ela vêm reparar o "mal" que fez? Mas, isso tudo é real mesmo? Ou apenas uma brincadeira de mau gosto.
— Sara , calma, eu vou trazer um chá de camomila pra você. Por favor, senta no sofá.
Simone fez o chá em cinco minutos, e Sara não se sentou e muito menos manteve-se calma, aquilo era a gota d'água, sua vida está virando de cabeça para baixo , e as mudanças em pouco tempo demais para projetar caminhos para seguir e o que mais ela odiava, decisões.
Simone correu com o bule e duas pequenas xícaras de porcelana branca, com os olhos esbugalhados a mulher trouxe a enteada que andava sem rumo pela casa e a sentou no sofá.
— Minha flor, você vai ter que me escutar. — Virou delicadamente o rosto da garota para ela.
— Consolações não curam feridas, você está certa. Mas oportunidades, não podem ser jogadas fora, não para pessoas como nós, neste país.— Do que você está falando, Mone?
— Questionou a garota mais atenta.— Você nunca pensa em você, não em primeiro lugar, sempre bota o bem-estar dos outros na frente. E eu te pergunto, Sara qual é seu maior sonho?
— Levar o legado do meu pai, sustentar o restaurante dele. — Diz confusa, reparando na intenção de sua madrasta com a questão.
— É muito nobre da sua parte. Mas não significa que seja o certo para si, esse era o sonho do seu pai ,Sara. Qual é o seu sonho? — Questionou a madrasta novamente.
— Ficar com você, me tornar uma grande administradora, fazer com que nossa cidade atraísse mais turistas.
— Respondeu a jovem novamente, agora com mais clareza.— Esse é o meu sonho , minha menina. Eu sei que não é o seu.
— Discordou Simone sorrindo, e olhando para Sara como se esperasse por algo.— Meu sonho é...— Sara pensa por alguns segundos. — É ter uma biblioteca para que as crianças tenham acesso a livros com mais facilidade, talvez publicar alguns, dar aulas de português , e falar mais de um idioma para poder viajar muito e comer de muitas gastronomias diferentes.
Simone abriu seu grande sorriso espontâneo e agarrou Sara em seu abraço caloroso. Sara ainda perdida retribuiu, era tudo aquilo que tanto precisava agora.
— Sabe como você conquista isso tudo? — Questionou Simone ainda no abraço.
— Como? — Perguntou Sara, curiosa.
— Indo à universidade. — Sara rapidamente se separa do abraço.
— Você está considerando a carta?
— Perguntou, com requinte de indignação na voz.— Sim, eu estou, e você também tem.
Eu sei que estar com a mulher que não conhece, que diz ser tua avó, numa situação dessa é péssimo. Mas nisso tudo, eu vi uma luz no fim do túnel. Você é um pássaro , e aqui não pode ser tua gaiola, é nova demais para resumir seus sonhos à um lugar, um dever e obrigação. Nova demais para não ser livre pra sonhar, grande demais para caber nesta gaiola.— Você não entende Mone, minha mãe me abandonou e morreu, minha avó nunca se importou, nunca. Agora que eu não tenho ninguém ela me adota como órfã, faz caridade, como posso ser tão burra em aceitar? Eu...
— Simone a interrompe.— Pior é ser tola em negar, você não vai para fingir gratidão e amor à alguém que te fez o mínimo, está lá para resgatar aquilo que sim, você merece! Não é aceitar caridade, é o seu direito, não é adotar um órfã, é reconhecer um neto! Voa, minha filha. Eu preciso que você faça isso, realize seu sonho! — Simone se esforça se aproximando da garota, que agora em pé caminha para longe.
— Faça isso Sara, por favor, você vai depois. Faça algo por você uma vez na vida, faça por seu pai, pelo menos.
Ele me disse, o quanto queria te ver conquistar tudo aquilo que desejasse.Sara ouvindo estas palavras, levanta seu semblante já desfeito em lágrimas, pega o envelope e a carta e caminha pelo corredor em silêncio.
— Antes de qualquer coisa Simone, eu preciso decidir , e você não imagina como eu odeio isso.
Após dizer, a jovem correu pela escada e se trancou no quarto, para mais uma sessão pessoal de sua tempestade, e a de hoje demoraria a ter certeza se chegaria até uma calmaria.

VOC? EST? LENDO
A noite em que eu soube o seu nome
RomanceSara era feliz ao lado de seu pai, o homem alegre e bondoso que a criou depois da sua m?e a ter deixado apenas dois dias após seu nascimento e jamais ter voltado. Ela morava em uma ilha na Bahia, a 蹿补尘í濒颈补 tinha um restaurante familiar beira-mar , s...