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AS ?GUAS VERMELHAS

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Algo ruim havia acontecido e isso mudaria minha vida.

Estávamos terminando a extensão do muro e o milagre do qual os mais velhos habitantes de Pérgamo sempre falavam sucumbiu.

As águas que usamos por muitos e muitos anos viraram sangue. É claro que na realidade em que vivemos algo do tipo já havia acontecido, mas nunca demorou tanto para passar. Eu e Tony estávamos na sala de Malik, líder da comunidade, por um motivo um tanto interessante: ele nos chamou para liderar um grupo de busca por suprimentos.

Tony, um cientista muito inteligente, era alguns anos mais velho do que eu, não passando dos 25 (não me lembrava de sua idade). Deixava uma barba rasteira negra crescer e não costumava lavar tanto seus curtos cabelos (dizia ele que era desperdiçar o tempo possível de ser aproveitado em mais criações e estudos).

Malik, líder de Pérgamo, já era um velhinho. Cultivava uma barba prateada volumosa e andava sempre com um cajado, algo que eu nunca vi sendo usado contra os mortos. Entretanto, ele era a pessoa mais sábia e respeitada em Pérgamo, principalmente por ter vivido tempos em que talvez os mortos ainda não voltassem à vida... assunto do qual ele não comentava muito e que talvez nem fosse verdade, pois parecia que ninguém sabia quanto tempo fazia desde o apocalipse.

– Não está na hora de desistir, a maré vermelha vai passar e os peixes vão voltar. Agora que estávamos expandindo o nosso lar vamos abandoná-lo?! – Tony estava com raiva porque era o criador do projeto da expansão dos muros da cidade. Não queria de forma alguma abandonar algo que pôs tanto esforço e expectativa.

Malik considerava Tony o mais inteligente de todos, um reconhecimento realmente merecido. Por admirá-lo, não lhe lançou um olhar de reprovação, mas de decepção por ele não conseguir enxergar o lado crítico da situação.

– Não é o momento de se preocupar com os nossos projetos e sim com o nosso povo – corrigiu-o o velho Malik, folheando alguns arquivos organizados em pilhas sobre a rústica mesa de escritório. – Posso contar com você em obter alimento e armamento para a nossa evacuação? – Tony afirmou com a cabeça e saiu em silêncio. O líder gesticulou para eu me aproximar logo em seguida.

– John, não estou totalmente convencido de que ele executará a tarefa como prometeu. Tony pode ser inteligente, mas muitas vezes não consegue enxergar a real razão pela qual eu tenho que tomar decisões como esta... decisões que podem determinar o futuro de todos os habitantes de Pérgamo. Preciso que fique de olho nele para que tudo ocorra como planejado. Pode fazer isso por mim? – Malik sempre teve esperanças de que eu passasse e ser um dos maiores líderes da comunidade, mesmo depois de eu ter falhado ao sair do orfanato... da escola... da "faculdade" (que na verdade eram quase sempre com os mesmos professores, pois não se sobrou muitos deles vivos).

– Sim senhor. Garanto que nada sairá dos planos. – Pensei que aquela seria a oportunidade de finalmente impressioná-lo e fazê-lo ficar orgulhoso por todo o tempo que gastou comigo. Sempre tive a impressão de que, na verdade, o que ele sentia por mim era mais pena do que esperanças. Meus pais morreram quando eu tinha meses de vida, sendo levado para o orfanato da comunidade e crescendo junto com muitos outros que também tiveram o mesmo azar. Malik sempre me levava para sua sala e me ensinava sobre liderança. Eu ficava impressionado, porém, nunca tive vocação para estar à frente de outros.

– Aguardarei seu retorno John, espero que consigam alguma coisa. – Prestes a sair ele me chamou novamente. – Espere... tome muito cuidado lá fora. – Assenti e saí da sala, pensando se realmente era o certo deixar nossa casa na qual vivemos por quase um século. Pérgamo tinha quase o tamanho de uma cidade pequena, com uma estrutura fora dos padrões.

Entrementes, o problema era exatamente este: muitas bocas para alimentar.

...

Mais tarde encontrei Tony em seu "laboratório", o qual na verdade era uma garagem cheia de bugigangas.

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